quinta-feira, 3 de março de 2011

Aprendendo a voar... De outro jeito...


Dia desses eu estava em um ponto de ônibus aqui da cidade, aguardando o "Armênia". 

Eis que chega uma mulher com um bebê no colo, acompanhada de uma menina de pouco mais de 10 anos que caminhava de cabeça baixa, sem olhar para os lados. Só olhava para o tênis branco com os cadarços bem coloridos, que ostentava dando grandes passadas à sua frente.

Minha primeira impressão, ao olhar uma mulher com um bebê no colo, é sempre de admiração e carinho. Logo mais eu já não pensava assim...

Minha primeira pista para transformar a impressão anterior, foi a de ver que a mulher havia deixado cair no chão, sem perceber, o pano destinado ao bebê (aquele para limpar a boca da criança e coisa e tal...). Pois bem, foi uma moça que vinha lá atrás que percebeu a perda, recolheu o paninho da calçada, bem próximo ao fio de água de esgoto e o levou até a mulher, que o devolveu pra perto da boca da criança (nem deu aquela chacoalhadinha, pra disfarçar!).Ops!

A segunda pista, foi mais como uma bigorna, me despertando dos meus sonhos de admiração e carinho...sentada ao lado da mulher, a menina desamarrava os cadarços coloridos do seu tênis branco, próprio do costume de meninas e meninos de sua idade. A mãe (foi aí que descobri que a mulher era mãe da menina), gritando como quem falasse com alguém beeeeem distante de si, perguntava pra menina o que é que ela estava fazendo; se ela sabia como estava ridícula com aquele cadarço desamarrado; que ela seria chamada de horrorosa pelos amigos da escola, porque ela estava horrorosa; que ela estava parecendo uma palhaça - e se ela sabia como era uma palhaça (quase interferi aqui, dizendo: _Sim, sim, eu sei! Tá linda!). Por fim, a mãe - dada a imobilidade da filha, que não amarrou o cadarço como ela mandava - retirou os cadarços do tênis da menina, de forma agressiva enquanto gritava que se ela queria ser feia e ridícula, a mãe a ajudaria!

Enquanto tudo isso acontecia, eu e a menina nos olhávamos por cima do ombro da mãe, sem que esta percebesse. Eu fazia caras e bocas do tipo "Não liga não, tá tudo certo!", "Fica firme, escuta a boca dela se mexendo e não registra nada...vai passar..." e ela fazia cara de que lá de dentro da casca em que morava, me entendia. Ela só recolheu os cadarços e olhou pra mim.

O ônibus que eu esperava chegou e, antes que eu subisse nele, olhei pra mulher com uma cara de poucos amigos e pra menina, disse assim:

"_Cê é linda, viu?"

Espero que ela não tenha visto somente minha boca se mexendo... Enquanto olhava no fundo dos meus olhos.

Na hora, lembrei-me da história "Uma ponte entre dois reinos", da incrível Marina Colasanti. É uma narrativa de Marina sobre moça que tece uma ponte com seus cabelos - mesmo a mãe tendo feito de tudo pra que isso não acontecesse - e sobre ela atravessa rumo à maturidade. Pra essa menina do ponto de ônibus, eu gostaria de contar esta história bem baixinho, com ela recostada numa almofada, bem relaxada... Quem sabe...

Inté.

2 comentários:

  1. foi emocinante ler essa história, Dé, principalmente porque ela mais corriqueira que a gente imagina, mas de tão distraídos com nossas correrias às vezes nem notamos. Não se respeita a criança e muito menos o universo dela. Ainda bem que tem você e muitas outras pessoas que fazem alguma coisa pra amenizar e mudar essa falta de educação dos adultos.
    Acho que com o adolescente a situação ainda é pior.

    ResponderExcluir
  2. Se é assim, sejamos feios e ridículos então!
    Linda história, Débora.
    Alegria sempre!

    ResponderExcluir